Na Rua Pinheiro Machado, famosa por ser "a mais bonita do mundo" |
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Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, é o
tema desta nova postagem. Visitei a cidade em junho de 2025, durante o feriado
prolongado de Corpus Christi, na companhia de Wagner Cosse.
Para uma cidade que ainda está tentando renascer das cinzas — ou melhor, da inundação que quase a destruiu completamente em maio de 2024 —, muita coisa ainda está por fazer. Ainda assim, é possível visitar alguns de seus principais monumentos, áreas de lazer, centros culturais e museus.
Próximo ao Mercado Municipal
Ficamos hospedados na área central da cidade, perto do Mercado Público, na região conhecida como “centro histórico”. A pé, em poucos minutos, é possível acessar vários atrativos, o que facilita muito a locomoção, sem necessidade de transporte.
Fundado em agosto de 1864, o belo prédio do mercado apresenta um estilo neoclássico. Internamente, tem hoje um caráter mais turístico e gastronômico do que propriamente comercial. Há, sim, bancas de frutas, verduras e outros alimentos, além de lojas de utensílios para chimarrão, pontos de venda de artesanatos e outros objetos. Chama a atenção a presença de várias lojas de artigos religiosos, especialmente voltadas às religiões afro-brasileiras.
Conversamos com alguns lojistas, ainda abalados pelas perdas causadas pela enchente que invadiu o prédio com mais de um metro de água. Segundo eles, os governos municipal e estadual pouco fizeram para ajudá-los a recuperar dos prejuízos. Muitos recorreram às tradicionais “vaquinhas” entre amigos para conseguir reabrir as portas.
No mercado, há vários restaurantes. Dentre eles, destaca-se o Gambrinus, o mais antigo de Porto Alegre, fundado em 1889. Sua especialidade são peixes e frutos do mar, destacando os pratos feitos com bacalhau. Para quem deseja economizar, há um prato do dia com preço mais acessível. A casa também oferece vinho tinto, ideal para acompanhar a refeição.
Praticamente ao lado do mercado está o Paço Municipal, um prédio histórico de 1901, em estilo eclético. Segundo nos informaram, o gabinete do prefeito ainda funciona ali, mas não as principais secretarias. O local abriga uma pinacoteca com exposições permanentes e temporárias. Em cartaz, uma mostra sobre a enchente de 2024 e uma exposição comemorativa do centenário do Salão de Outono de 1925 — a primeira (e única) grande exposição de arte moderna do Rio Grande do Sul.
Em frente ao Paço, na Praça Montevidéu, está a Fonte Talavera de La Reina, presente da colônia espanhola à cidade em 1935, ano do centenário da Revolução Farroupilha. A fonte, que se tornou ponto turístico, define o Marco Zero de Porto Alegre.
Ainda nas redondezas, está o Chalé da Praça XV, um dos mais tradicionais bares e restaurantes da capital gaúcha. Fundado em 1885 como uma sorveteria, passou por reformas, sofreu um incêndio em 1971 e, em 2011, foi adquirido pela prefeitura, restaurado e tombado como patrimônio histórico local.
Praça da Alfândega
Caminhando um pouco mais, chegamos à Praça da Alfândega, uma das mais emblemáticas da cidade. Ali estão alguns dos prédios mais icônicos da capital, como o Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS), o Memorial do Rio Grande do Sul e o Farol Santander — este último, um centro cultural nos moldes do CCBB, com salas de exposição, café e cinema.
Todo o complexo da praça é tombado como Patrimônio Histórico, em razão de seu inestimável valor arquitetônico. A maioria dos edifícios data das primeiras décadas do século XX e possui arquitetura requintada. É ali que acontece a famosa Feira do Livro de Porto Alegre, criada em 1955 e considerada Patrimônio Imaterial da cidade. A feira costuma ocorrer entre outubro e novembro.
Uma das ruas que circundam a praça é a Rua dos Andradas, cujo trecho mais conhecido é chamado de Rua da Praia. Nela, encontram-se outros prédios históricos em estilos art déco e art nouveau. Lá também está o antigo Hotel Majestic, restaurado nos anos 1980 e transformado no Centro Cultural Mário Quintana (CCMQ).
Centro Cultural Mário Quintana
De acordo com a Wikipedia, o CCMQ sedia a Biblioteca Lucília Minssen, a Biblioteca Érico Veríssimo, parte do Museu de Arte Contemporânea do RS, os acervos de Elis Regina e Mário Quintana, a Discoteca Pública Natho Henn, as galerias Xico Stockinger e Sotero Cosme, os teatros Bruno Kiefer e Carlos Carvalho, além de três salas de cinema, cafés, bombonière, livraria e o Jardim José Lutzenberger, no terraço do quinto andar. Trata-se, portanto, de um espaço cultural dinâmico, com grande e permanente visitação.
O centro cultural leva o nome de Mário Quintana (1906–1994) porque o poeta residiu num quarto alugado, durante as décadas de 1960 e 1970. Solteiro, dedicava-se aos livros e ao trabalho no jornal Correio do Povo, localizado a poucos metros. Seu dormitório foi preservado no museu, revelando sua paixão por suas musas: Greta Garbo, Cecília Meireles e Bruna Lombardi, exibidas em retratos dependurados nas paredes. Esta última, inclusive, era amiga próxima e o visitava anualmente.
A sala dedicada a Elis Regina (1945–1982) reúne recortes de jornais, capas de discos, fotografias e outros itens que relembram a carreira da cantora porto-alegrense, que brilhou entre os anos 1960 e 1982.
Este Quarto
Este quarto de enfermo, tão deserto
de tudo, pois nem livros eu já leio
e a própria vida eu a deixei no meio
como um romance que ficasse aberto…
Que me importa este quarto, em que desperto
como se despertasse em quarto alheio?
Eu olho é o céu! imensamente perto,
o céu que me descansa como um seio.
Pois só o céu é que está perto, sim,
tão perto e tão amigo que parece
um grande olhar azul pousado em mim.
A morte deveria ser assim:
um céu que pouco a pouco anoitecesse
e a gente nem soubesse que era o fim…
Praça da Matriz
Andando mais um pouco, chegamos à Praça da Matriz,
onde se localizam o Palácio Piratini, o Theatro São Pedro e a Biblioteca
Pública do Estado, dentre outros edifícios. Visitamos o interior da matriz e da
biblioteca.
A Biblioteca Pública do Estado do RS é deslumbrante, principalmente por dentro. Inaugurada em 1922, é adornada com pinturas e mobiliário criados especialmente para o prédio, com requinte raro nos dias atuais. O estilo é eclético, com forte influência do estilo positivista, vigente naquela época. Há salas temáticas, como a Sala Egípcia e o Salão Mourisco, voltado para recitais, saraus e lançamentos literários.
As pinturas murais de Fernando Schlatter (1870–1949) estão atualmente em processo de restauração, após décadas de desgaste — e até de uma decisão equivocada de um antigo diretor, que as considerou “fora de moda” e mandou cobri-las com tinta cinza nos anos 1950. O prédio ainda conserva um elevador antigo em funcionamento e guarda cerca de 200 mil volumes.
A matriz é imponente, embora não especialmente marcante. A Igreja de Nossa Senhora das Dores, também no centro, tem um interior bem mais rico e interessante. Ainda assim, vale a visita, sobretudo por seus vitrais. Tive a oportunidade de conhecer os dois templos.
Outras atrações
Outro ponto que merece destaque é o Cais Embarcadero, próximo à Usina do Gasômetro. Reformado em 2021, o antigo espaço portuário deu lugar a restaurantes, lojas e áreas de lazer. É um dos melhores locais para apreciar o famoso pôr do sol porto-alegrense, ato compartilhado com centenas de pessoas que se reúnem no local todo final de tarde.
Mais distante do centro, visitamos a Fundação Iberê Camargo, dedicada ao renomado pintor gaúcho (1914–1994). O prédio atual foi projetado pelo arquiteto português Álvaro Siza (1933), e é uma obra de arte por si só. Localizado às margens do Guaíba, próximo a uma pista de corrida e caminhada e a um shopping, o espaço é uma das atrações mais impactantes da cidade. As exposições, no entanto, não me chamaram tanto a atenção.
Nas imediações, há uma praça com vista para vários pontos da cidade, onde está uma escultura em homenagem aos voluntários que atuaram durante as enchentes de 2024.
Ainda na região central, a cerca de dois quilômetros do nosso hotel, fica o Parque da Redenção, o maior e mais frequentado de Porto Alegre. É uma extensa área verde, arborizada, ideal para caminhadas. Apesar do frio, o sol ajudou. No dia da visita, havia três feiras: uma de brechós, uma de artesanato e outra de produtos orgânicos. O parque é frequentado por muitas famílias com crianças.
Nas redondezas, encontram-se o Colégio Militar e a igreja gótica dedicada a Santa Teresinha — um templo belíssimo, especialmente por dentro.
Outro lugar encantador é a Rua Pinheiro Machado, apelidada de “a rua mais bonita do mundo” pelo biólogo português Pedro Nuno Teixeira Santos. São cerca de 100 tipuanas ao longo de 500 metros de calçada, criando um túnel verde. A fama atraiu visitantes e levou ao tombamento da via pelo patrimônio municipal. Ela fica no bairro Independência, próxima ao Shopping Total.
Mais adiante, pegamos um Uber e visitamos o Museu de Ciências e Tecnologia da PUC-RS, considerado “cinco estrelas” por muitos guias turísticos. O acervo é excelente e as experiências interativas atraem crianças, adolescentes e adultos. No entanto, senti falta de instrutores para aprofundar a compreensão dos mecanismos, mesmo com as legendas disponíveis. Isso tornaria a experiência ainda mais enriquecedora. Algumas atrações, como a da eletricidade estática (que faz os cabelos se levantarem), geram filas.
Vale ressaltar, na área central da cidade, o antigo Cine-Theatro Capitólio, hoje transformado em cinemateca. Inaugurado em 1928, chegou a ter 1.300 lugares. Após anos de decadência, fechou em 1994. Hoje, conta com uma sala de 164 lugares, duas salas de pesquisa, uma multimídia, uma galeria de exposições e quatro andares de acervo audiovisual do estado. No dia da visita, estava em cartaz “Cidadão Kane” (1941), clássico de Orson Welles que frequentemente figura entre os maiores filmes da história.
Encerro este texto com mais um poema de Quintana, que reflete suas emoções ao caminhar pela Porto Alegre de seu tempo:
O Mapa
Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...
(E nem que fosse o meu corpo!)
Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...
Há tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)
Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso
Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)
E talvez de meu repouso...
Em breve, mais postagens!
Mercado municipal
Wagner e eu no Grambrinus |
Interior do mercado |
Chalé da Praça XV |
Paço Municipal |
Mural em homenagem ao povo afro-brasileiro |
Fonte espanholaPraça da Alfândega e arredores |
Farol Santander |
MARGS |
Arquitetura da rua da Praia |
Escultura de Drummond e Quintana |
Centro Cultural Mário Quintana
Quadro de Quintana |
Foto do poeta no antigo hotel Majestic |
Acervo Elis Regina |
Galeria de arte |
Fachada do centro culturalPraça da Matriz |
Fachada da catedral |
Interior da igreja |
Vitral |
Theatro São Pedro |
Teatro ao ar livre do complexo do Theatro São Pedro |
Lateral do teatro |
Interior do complexo |
Fachada |
Projeto de pinturas nos prédios do centro da cidade |
Palácio da Justiça |
Escultura da justiça na fachada do palácioBiblioteca |
Elevador |
Salão Mourisco |
Sala Egípcia |
Palácio PiratiniCais Embarcadero |
Wagner aprecia o pôr do sol no Guaíba |
Um brinde no Cais EmbarcaderoFundação Iberê Camargo |
Detalhe da fachada |
Galeria |
Interior da fundação |
Wagner posa no logotipo de Porto Alegre, perto da fundação |
Vista do centro de Porto Alegre |
Escultura homenageia voluntários das enchentes de 2024 |
Shopping |
Praça nas proximidades da fundação |
Vista da arena do Beira RioParque da Redenção |
Igreja de Santa Terezinha |
Interior do templo |
Vitrais |
Museu de Ciências e Tecnologia da PUC-RS
Rua Pinheiro Machado
Cine Capitólio |
Igreja de Nossa Senhora das Dores |
Interior da igreja |
Que maravilha! Viajei neste relato e belos registros
ResponderExcluirAgradecido, meu caro. Abraços
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