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Com Wagner Cosse, no mirante da Serra das Araras (foto de Elson Barbosa) |
Fotos de Thelmo Lins e Wagner Cosse
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A
serra ali corre torta. A serra faz ponta. (...) Hem? O senhor? Olhe: o rio
Carinhanha é preto, o Paracatu moreno; meu, em belo, é o Urucuia - paz das
águas... É vida!
(Guimarães Rosa)
Estou
na segunda e última parte da jornada pela região do Parque Nacional do Grande
Sertão: Veredas (PNGSV), no noroeste de Minas Gerais. A viagem foi realizada entre
os dias 27 e 29 de julho de 2018. Nesta postagem, vou relatar os dois últimos dias
da viagem, conduzida pelo guia e condutor Elson Barbosa, e compartilhada com
meu companheiro de aventuras Wagner Cosse.
Por
falar em aventura, é preciso – como disse na postagem anterior – ter um
relativo preparo físico para esta empreitada. Os lugares pedem boas caminhadas
e algumas subidas de morros, em trilhas nem sempre fáceis. Além disso, as
estradas da região são quase todas de terra (ou de chão, como dizem os
moradores), com muitas costeletas e, por vezes, camadas grossas de areia que enterram
os pneus dos automóveis mais baixos. O ideal, como publiquei na postagem
anterior, é ter um carro com tração nas quatro rodas ou, no mínimo, um veículo
mais possante. Caso você não tenha, é possível alugar este tipo de veículo em
Chapada Gaúcha, onde está a sede do parque.
No
segundo dia visitamos a região de Buracos e Buraquinhos, onde existe o Cânion
ou Vão dos Buracos, um generoso corredor ecológico que liga o PNGSV ao Parque
Estadual da Serra das Araras. Não atravessamos todo o cânion, mas caminhamos
boa parte de seu trajeto, banhado pelos rios que dão nome ao local, por belos
montes e um sem número de plantas, que caracterizam a flora do cerrado. Pudemos
também banhar no rio Buraquinhos, que forma vários pocinhos azulados, com água
bastante fria. Em suas margens, areias brancas que lembravam as praias nordestinas.
Na
região há um mirante onde se pode antever o roteiro. Na parte mais baixa do
cânion, florescem os buritis que demarcam as veredas. Foi inevitável lembrar os
belíssimos oásis que visitamos em Marrocos. A paisagem, aliás, lembrava muito
aquele país africano em vários momentos. Até mesmo no confronto entre a secura do
sertão o verde generoso de onde brotava água.
No
terceiro e último dia da viagem, Elson nos levou para Serra das Araras, um
distrito de Chapada Gaúcha, a aproximadamente 40 km da sede. O lugarejo, que
tem Santo Antônio como padroeiro, é a porta de entrada do parque estadual. Segundo
Elson, a festa do santo é um acontecimento junino (13 de junho), que atrai visitantes
de toda a região.
O
trajeto envolveu caminhada de aproximadamente 8 km pela Trilha do Peregrino.
Boa parte dela, uma subida bastante íngreme. O final dava no cume de uma das montanhas
mais altas, mas eu fiquei um pouco abaixo, perto da Gruta do Coração, estação
de parada. Dali se tem uma vista deslumbrante da região, além de uma brisa
constantes que ameniza o calor. Wagner e o nosso guia foram adiante até o topo.
A
proposta, a seguir, era almoçar em Serra das Araras. Mas, naquele domingo, não
havia nenhum restaurante aberto no lugarejo. Assim, tivemos que nos contentar em
nos alimentar em uma padaria local. Felizmente, como das vezes anteriores, havíamos
levado lanche, que envolvia frutas, barrinhas de cereal e muita água.
Por
fim, rumamos para a Cachoeira das Araras, cerca de 10 km dali, de automóvel. A
trilha atravessa uma estrada formada por areia branca. Tivemos que dirigir com
bastante cuidado e, mesmo assim, quase atolamos o carro. Nessas condições, exigem-se
decisões rápidas e boas escolhas do trajeto. Caso contrário, a solução é chamar
o guincho.
A
Cachoeira das Araras é uma visão esplêndida. O riozinho vem caindo em várias
pequenas quedas, que formam verdadeiras duchas de águas refrescantes. Elas desembocam
no rio Catarina, que tem águas mornas. Tudo isso ladeado pelas tais areias. A
flora é bastante rica, com muitas espécies interessantes. O espaço, felizmente,
é considerado uma reserva de preservação ambiental.
O
dia já terminava e era hora de voltarmos para o hotel. Durante os três dias da
viagem, conhecemos um pouco de Chapada Gaúcha, que está em franca expansão de
seu agronegócio. Plantações de soja e capim para alimentar a indústria pecuária
são as principais fontes de renda do município. Como diz o nome, ele foi
formado por um agrupamento de gaúchos que saiu do Rio Grande do Sul, no início
dos anos 1970, para buscar melhores condições de vida na região. Por isso, a pequena
cidade (cerca de 13 mil habitantes) tem um Centro de Tradições Gaúchas e seus
moradores conservam o hábito de tomar chimarrão mesmos nas altas temperaturas.
O
turismo ainda é incipiente. Em quase todas as trilhas, fizemos somente nós três:
Wagner, o guia Elson e eu. Mas há muitos planos e sonhos, que podem incrementar
o setor, inclusive o fato de existir um hotel do porte do que nós nos
hospedamos, o Ares do Sertão, que traz conforto para os hóspedes e visitantes.
A
viagem terminou com mais um trecho do livro Grande Sertão: Veredas, de
Guimarães Rosa, interpretado por Elson. Desta vez, ele narrou a morte da
Diadorim, um dos momentos mais marcantes desta obra fenomenal.
Na
viagem de volta, que percorre – dentre outras – a Rodovia Guimarães Rosa, paisagens
belíssimas que nos convidavam, a todo momento, a estacionar o carro e sacar a
máquina fotográfica. Momentos inesquecíveis que guardaremos por toda vida.
Mire
veja o que a gente é: mal dali a um átimo, eu selando meu cavalo e arrumando
meus dobros, e já me muito entristecia. Diadorim me espreitava de longe,
afetando a espécie de uma vagueza. No me despedir, tive precisão de dizer a
ele, baixinho: — “Por teu pai vou, amigo, mano-oh-mano. Vingar Joca Ramiro...”
A fraqueza minha, adulatória. Mas ele respondeu: — “Viagem boa, Riobaldo. E
boa-sorte...” Despedir dá febre.
(Guimarães Rosa)
Vão dos Buracos
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Rio Buraquinhos |
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Guia Elson: condução e interpretação de textos de Guimarães Rosa |
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Wagner em uma das trihas do cânion |
Serra das Araras
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Igreja de Santo Antônio |
Trilha do Peregrino
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Gruta do Coração |
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Wagner e Elson no alto da montanha |
Cachoeira da Arara Vermelha e Rio Catarina
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Elson dizendo textos de Guimarães Rosa |
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Estrada |
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Cueca virada, uma iguaria local |
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Com Artur (recepção) e Everton, proprietário do hotel Ares do Sertão |
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Rodovia Guimarães Rosa |
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Ipê branco à beira da rodovia |