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sexta-feira, 11 de março de 2016

Marrocos Parte 3 - O encanto da neve e os mistérios de Fez

Wagner e eu brincando na paisagem gelada de Ifrane


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Consulte o pequeno dicionário na postagem de Marrocos - Parte 1 para entender alguns termos

            Paisagens, costumes, gastronomia, vestuário... tudo em Marrocos difere da realidade brasileira. Diariamente, cinco vezes por dia, os alto-falantes dos minaretes das mesquitas reverberam as vozes de homens entoando orações. Como são muitas as mesquitas, parece o que se escuta é um grande coral, cheio de sentimento e religiosidade. Ao ouvir este som, o marroquino interrompe tudo que por acaso esteja fazendo e faz sua meditação. Para nós, ocidentais, criados na fé cristã, este é com certeza um dos mais tocantes costumes islâmicos.
            Em uma extensão de pouco mais de 446.000 km2, ou seja, uma região menor do que a do estado de Minas Gerais, onde vivo, é possível ver belíssimas praias, montanhas de mais de 4.000 metros de altitude, desertos de areia e até áreas que demonstram vestígios de ter havido ali um grande mar ou oceano há milênios atrás.
            Ainda na região de Mergouza, visitamos oásis, antigas crateras e vimos as chapadas que fazem a divisa do país com a Argélia. Como os marroquinos estão em conflito com os argelinos há muitos anos, a região é constantemente monitorada pelo exército. Conhecemos um grupo musical berbere, os Pigeons du Sable, que fizeram uma pequena apresentação para nós (confira o vídeo no site: https://www.youtube.com/watch?v=y0IvwPUG7Sc ). No final, nos convidaram para dançar e cantarolar com eles, num movimento de congraçamento de culturas.
Por fim, visitamos uma cooperativa de artesãos. A vontade que temos, inicialmente, é de levar tudo. Ou, pelo menos, um exemplar de cada arte: lanternas decorativas, louças pintadas, roupas finissimamente bordadas e tapetes. Infelizmente nem o bolso nem o peso na bagagem nos permitiam tal estripulia. Mas acabamos nos rendendo a um belo tapete marroquino, típico dos povos do deserto. Graças à dica de pechinchar sempre, ele acabou saindo menos da metade do preço original.
Depois de nos despedirmos de Merzouga e Erg Chebbi, partimos para o norte do país. O objetivo era chegar a Fez, uma das quatro cidades imperiais de Marrocos (as outras são Marrakech, Meknés e a capital, Rabat). O caminho se descortinou em novas e surpreendentes paisagens. Belíssimos lagos, montanhas e vales incríveis. Alguns com vistas panorâmicas de tirar o fôlego.
Como estávamos prevenidos, começamos a notar que a temperatura continuava a abaixar. Entrávamos na região do Alto Altas, cuja principal referência era a cidade de Ifrane, um recanto alpino criada pelos colonizadores franceses nos anos 1930. Diferentemente das casas marroquinas, sem telhado e com cores de terra, que iam do ocre ao vermelho, as residências em Ifrane tinham telhados que lembravam as construções enxaimel, comuns no sul do Brasil, além de lindas avenidas cobertas de árvores.
Mas o mais espantoso se deu pouco antes de chegarmos a Ifrane. A sequidão do país começou a ser substituída por grandes grupos de montanhas brancas pela neve que havia caído dois dias atrás. Viam-se pequenos grupos de esquiadores, brincando nos dorsos das montanhas. Eu nunca tinha visto neve ao vivo. Wagner, que faz esta viagem comigo, já tinha vivido a experiência na região do Peru e da Bolívia. Mas confessou que nada se comparava àquela manifestação. Toda a paisagem salpicada de branco. Em determinado momento da estrada, já beirando o horário do por do sol, atravessamos uma inacreditável floresta de cedros, conhecida como Parque Nacional de Ifrane. Todas aquelas árvores enormes com suas copas tingidas de branco, com o sol atravessando seus caules e folhas. Confesso que foi o dia mais incrível da viagem. Tornamo-nos crianças perante toda aquela beleza. Até mesmo o nosso motorista, Ahmed, confesso que nunca tinha atravessado aquela região com tamanha incidência de neve. Em compensação, o frio estava de rachar e chegou a quatro graus negativos.

Fez – a cidade dos artesãos


Chegamos a Fez já de noitinha. Ali nos hospedaríamos no Dar Dalila, o hotel do francês Geoffroy Haury que foi um dos nossos mais queridos anfitriões. Ele mudou-se para Marrocos há 14 anos. Ali, comprou a residência que transformaria em seu aconchegante hotel. Na primeira noite, ele já nos preparou um delicioso jantar, regado a um vinho local muito saboroso.
De manhã já nos aguardava, na porta do hotel (ou Dar), Ahmed e o nosso guia Mohammed. Este é um nome muito comum no país, pois significa Maomé, o grande fundador da religião islâmica. O rei, inclusive, chama-se Mohammed VI é descendente de Maomé. Mohammed, o guia, nos levou para conhecer a cidade, em especial a medina (centro velho) de Fez, que é a sua principal atração turística e onde atuam os mais sofisticados artesãos do país.
Embora em alguns momentos a visita se tornasse um roteiro de visitação a lojas e cooperativas de artesãos, o que me em deixou por vezes um pouco nervoso, pois não tinha intenção de comprar nada que fosse imposto (o guia ganha uma comissão a cada compra realizada), Mohammed também nos mostrou alguns pontos interessantes. Ressalto a impressionante vista que se obtém da cidade de uma de suas colinas. Um mar de construções em cor de ocre, com alguns telhadinhos verdes (das mesquitas), ladeado por grandes muralhas. Em cima das casas antiquíssimas (Fez foi fundada em há mais de 1.200 anos), uma enorme quantidade de antenas parabólicas. Atualmente, Fez tem mais de um milhão de habitantes.
Outro local muito interessante foi o Mellah, nome que se dá ao bairro judaico, e a Madrassa el-Attarine, local que abrigava os estudantes islâmicos no passado. Construída entre 1352, ela tem um rico pátio central, adornado por fantásticos azulejos e estuques de gesso, com elegantes portas de cedro. Visitamos, ainda, as portas do palácio real, em Fez, com um laborioso trabalho de artesanato em cerâmica e madeira.
Notamos que muitos pontos da medina estavam em restauração. Trata-se de uma ação da Unesco, com fundos internacionais (segundo Mohammed, a maior parte dos EUA). Ela está remodelando várias ruelas e lojas e até mesmo os tradicionais tanques de tingimento de couro, famosos por seu mau cheiro e pelas condições precárias a qual estavam submetidos os trabalhadores. Eles foram afastados durante o período, com um subsídio do governo marroquino. A reforma também inclui o saneamento básico e o esgotamento sanitário, pois antigamente todos os detritos eram lançados no rio. Quando estivemos na cidade, em fevereiro de 2016, as obras não tinham sido finalizadas.
No mais, uma série interminável de lojas pequenas e grandes, que vendiam de tudo, desde alimentos a tecidos, passando por roupas de couro, artesanato e até mesmo pente de osso – conhecemos o último artesão na cidade a trabalhar com isso, encerrando um ciclo, uma vez que não tem descendentes. Em Marrocos, o ofício é passado de pai para filho, sendo que o filho mais velho é o que costuma assumir a função. Visitamos, também, uma loja de bandejas e bules de chá banhados de prata e ouro, com minuciosos arabescos feitos a mão.
É claro que não resistimos em algumas ocasiões. No final do dia, depois de encher algumas sacolinhas, ainda fiz uma brincadeira com Mohammed, acusando-o de ser culpado de nossa “falência”.
Ao chegar na Dar Dalila, com o dia anoitecendo, ficamos horas a conversar com o nosso anfitrião, enquanto degustávamos mais algumas iguarias da gastronomia marroquina, preparados por ele, regadas a vinho marroquino.
Fomos dormir logo em seguida, pois o dia seguinte nos esperavam novas emoções. E emoções em muitos tons de azul.

Smeh liya (com licença), já estou indo!

Fotos de Thelmo Lins e Wagner Cosse


Paisagens marroquinas







Região de Ifrane






Floresta de cedros

Wagner no Parque Nacional de Ifrane

No parque de Ifrane


Praça principal de Ifrane

Os marroquinos adoram tirar foto ao lado deste leão de pedra.
Ele representa o último leão do país, que foi cruelmente abatido.

Fez (ou Fes)


Wagner na frente das portas do palácio real

Palácio real

Mellah

Vista geral de Fez








Rua estreita da medina






Açougue de carne de dromedário



Parte da medina restaurada pela Unesco




O último fabricante de pente de osso

Tanques de tingimento reformados



Wagner veste-se como um marroquino

Em uma das belas madrassas de Fez

Madrassa


Detalhe da pintura do exterior de uma mesquita



Detalhe de um restaurante




Esta e as fotos posteriores são detalhes da fachada de uma mesquita



Bordado

Bordado

Detalhe da secagem do couro

Loja de antiguidades


Bules de chá e travessas trabalhadas manualmente



O guia Mohammed me "obrigando" a fazer compras...

Wagner e eu com Geoffroy, proprietário da Dar Dalila

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