segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

Viagem ao Peru - Parte VIII - Machu Picchu

 

Conhecendo o esplêndido sítio arqueológico de Machu Picchu
(Foto de Wagner Cosse editada por Thelmo Lins)

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        A joia da coroa do turismo peruano, quiçá latino-americano, é, com certeza, Machu Picchu. “A cidade perdida dos incas”, como é chamada, tornou-se mundialmente conhecida em 1911 por meio do explorador e político estadunidense Hiram Bingham (1875-1956), que chegou ao local guiado por um garoto quéchua. De lá para cá, seu mistério só foi aumentando à mesma medida do interesse internacional. Em 1983, foi declarada Patrimônio Cultural e Natural da Humanidade pela Unesco. Em 2007, foi inserida na lista das Sete Maravilhas do Mundo Moderno por votação popular. Atualmente, o sítio arqueológico recebe cerca de 4.500 visitantes por dia.

            Para chegar a Machu Picchu, pegamos um trem na estação de Ollantaytambo, no meio do caminho entre Cusco e Águas Calientes, ponto final da viagem. Embora tenha alguns atrativos, como suas piscinas naturais, o lugarejo de aproximadamente 2.000 habitantes serve, praticamente, como local para ter acesso ao sítio histórico, localizado a oito quilômetros dali.

            A viagem de trem foi tranquila. O vagão tem vista panorâmica para as belas paisagens do Vale Sagrado, o que torna o passeio mais cativante. Fizemos o percurso no trem turístico. Para os que apreciam mais conforto e estão dispostos a pagar um pouco mais, tem um veículo mais sofisticado, com direito a música ao vivo e outras regalias.

            No dia em que fizemos a viagem, em meados de setembro de 2024, chovia um pouco, o que atrapalhou nossos planos a princípio. Logo que chegamos a Águas Calientes, uma horda de vendedores rumou em nossa direção, oferecendo capas de chuva. A minha primeira decepção foi saber que, para pegar o ônibus que nos levaria a Machu Picchu, não havia uma estação rodoviária. Os veículos param na rua mesmo e se cria uma enorme fila de passageiros na calçada. Como caia uma chuvinha mansa, mas persistente, os 30 a 40 minutos que ficamos ali na espera foram desanimadores. E é bom frisar que estávamos (Wagner, Regina e eu) com todas as passagens e vouchers comprados com antecedência e tínhamos uma guia nos dando suporte a todo momento.

            Toda a viagem ao Peru, como já mencionei anteriormente, foi realizada com extrema competência pelos órgãos turísticos locais. No entanto, o percurso para Machu Picchu se tornou o mais confuso e desorganizado do tour. Para complicar, houve um acidente na estrada com um dos ônibus, atrasando nossa chegada ao sítio. Atualmente, existem horários específicos para visitar Machu Picchu, ação desenvolvida para minimizar os efeitos do grande afluxo de pessoas ao local. No nosso caso, o acesso seria entre 11 e 14h. Já passava de 12h30 quando cruzamos a entrada de Machu Picchu. Ou seja, uma hora e meia depois do horário marcado.

            Achei que isso teria acontecido por causa do acidente na estrada. Mas, de acordo com amigos que estiveram lá em outra ocasião, a situação é permanente. O mesmo drama aconteceu na saída, quando a fila para pegar o ônibus para descer para Águas Calientes alcançava mais de dois quilômetros, com uma média de espera de uma hora e meia. Ressalto: no tempo, sem qualquer marquise ou suporte.

            Ir ao banheiro? Um suplício, principalmente para as mulheres. Filas quilométricas? Parar para fazer um lanche? Impossível. Caso contrário, nossa estada no sítio arqueológico seria ainda mais encurtada. Penso que os peruanos deveriam preparar uma estratégia para dar melhor atendimento e acolhida aos visitantes. Realmente, é muito desconfortável e cansativo. Para as pessoas mais idosas ou com problemas de locomoção, um suplício. Muitas pessoas preferem descer a pé os oito quilômetros, pois costuma ser mais rápido do que esperar no ponto de ônibus.

            Ainda tive que enfrentar outro problema na portaria, quando o meu ingresso não foi reconhecido pelo sistema. O nosso guia nos deu o devido suporte, mas tive que deixar o meu passaporte no local até a situação ser resolvida. Só pude resgatar o documento no final da visita, quando tudo foi solucionado.

            Dito isso – e suplantado o desgaste (chuva, atraso, filas, etc) – devo confessar que Machu Picchu supera todas as expectativas. O local é mais do que maravilhoso, é divino, excepcional. Essa beleza extraordinária, entre construções e a própria natureza, com suas montanhas imponentes, ameniza ou compensa todos os transtornos. O local é, realmente, lindo e qualquer adjetivo é pouco para descrever tamanha imponência.

            Atualmente, além de definirmos um horário para visitação, temos também que determinar um percurso. Comprando o ingresso, a gente (ou a empresa de turismo que contratamos) escolhe a melhor opção, de acordo com o interesse do visitante. No nosso caso, fizemos as trilhas 1 e 2. Cada percurso tem seu preço específico. Nesse caso (1 e 2) foi suficiente para conhecer os melhores lugares e apreciar as melhores vistas. Em outro percurso, é possível acessar alguns templos no topo dos morros, o que amplia a vista, mas exige maior preparo físico.

            Já de cara, logo na entrada, existe um mirante, de onde a maioria faz a clássica foto com a cidadela dos incas ao fundo. A chuva parou, aliviando o nosso estresse. Mais tarde ficamos sabendo que ela foi fundamental para conhecermos Machu Picchu em sua integridade. Os visitantes que fizeram o percurso na parte da manhã sofreram com a densa neblina que costuma tomar conta das montanhas, dificultando terrivelmente a visualização. Ou seja, restou-nos agradecer à natureza por brindarmos com a chuva e, consequentemente, com a paisagem que tivemos acesso.

            Não vou aqui discorrer sobre os locais visitados em Machu Picchu. Com uma pequena pesquisa, o visitante pode se aprofundar um pouco mais nos atrativos do local. A forma exímia que os incas tinham para encaixar as pedras, desenvolver a agricultura, observar os astros ou realizar seus cultos ao deus Sol. O mistério constante sobre as funções daquele local: seria um refúgio de descanso para os nobres? um templo sagrado? um lugar de manifestações políticas ou religiosas? ou simplesmente uma cidadela, onde viviam as pessoas comuns? Há vários estudos e ninguém ainda chegou a uma conclusão.

            Acredita-se, no entanto, que o sítio poderia ter sido construído por volta do século XIV e que, entre 1438 e 1470, a autoridade máxima dos incas, Pachacútec, teria vivido ali. Há lendas que dizem que os reis preferiam manter o lugar em sigilo e que todos os mensageiros eram mortos para não espalhar a notícia da sua existência. E não se sabe, também, porque houve o seu declínio e futuro “desaparecimento”. Nem mesmo os espanhóis, quando conquistaram o território peruano, sabiam de sua existência até a “descoberta” feita no início do século XX. Entre os quéchuas, o sítio era conhecido, mas ele estava envolto em uma densa mata que tomou conta de suas construções. Eles não tinham a noção de sua importância.

            Em determinado momento, durante a visita, eu me senti um pouco incomodado com os turistas falando alto, fotografando sem parar e penetrando os lugares inadvertidamente. Intimamente, senti que ali era um lugar sagrado e que merecia respeito, devoção, independentemente de escolhas religiosas ou influências culturais. Algo sagrado, divino, que ultrapassava o simples atrativo turístico. Afastei-me um pouco do grupo e fiquei ali meditando, olhando as montanhas, observando os detalhes daquela arquitetura ímpar. Respirei fundo e agradeci a oportunidade de conhecer aquele lugar sensacional e me senti em um dos pilares da civilização.

            Nesta postagem, encerro minha viagem ao Peru. Depois de Machu Picchu, retornamos a Cusco, de onde tomaríamos o avião de volta ao Brasil. Na bagagem, a certeza de que havia realizado um sonho e acumulado preciosas informações. Tinha pisado terras encantadas, únicas, soberanas, habitadas por populações de grande conhecimento científico, que nos deixou um legado de mistério e sabedoria.

            Até a próxima viagem!


No trem panorâmico: Regina, Wagner eu e uma viajante japonesa

Com visitantes do Brasil e da Argentina, na estação do trem

Em Águas Calientes, na fila quilométrica do ônibus

Regina e eu enfrentando a chuva com as capas recém adquiridas

A fila para pegar o ônibus no final da visita

Machu Picchu















Wagner e as montanhas






Na porta principal, no mesmo local onde Che Guevara
 foi fotografado nos anos 1950











Agradecendo à chuva por nos permitir ver 
o sítio arqueológico sem a densa neblina


sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Viagem ao Peru - Parte VII - Vale Sagrado dos Incas

 

Em Ollantaytambo (foto de Wagner Cosse)

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            Para conhecer melhor o Peru, em especial o Vale Sagrado dos Incas, é preciso decifrar uma série de nomes que parecem mais um trava-línguas. Além dos já citados anteriormente – Sacsayhuaman, Q’enco, Puka Pukara, Tambomachay e Coricancha – surgem outros: Chinchero, Moray e, principalmente, Ollantaytambo. Todos estes visitados por nós. E ainda há outros, que não conhecemos, como Intipunku, Phuyutamarca, Runkurakay, Wyña Wayna, Huayllabamba, Llactapata, Warmiwañusca e Sayacmarka, possíveis de ser acessados por quem faz a trilha dos incas a pé. Ou seja, difíceis de decorar e até de pronunciar.

 

            O Vale Sagrado é um dos lugares mais belos e misteriosos do país. Ali, entre Pisac e Ollantaytambo, em aproximadamente 60 km, os incas construíram cidades espetaculares, avançados postos de agricultura e salinas que resistem até os dias atuais.

            Começamos a visita por Chinchero, 28 km de Cusco, a 3.772 m acima do nível do mar. Ali existia a cultura pré-incaica de Ayamarca. Depois, o décimo imperador inca Tupac Yupanqui teria construído ali seus palácios. No século XVI, os conquistadores destruíram parte do conjunto e edificaram, em cima das fundações, um templo católico barroco, decorado com pinturas de Diego Quispe Tito e Francisco Chihuantito.

            No dia em que estivemos lá, o atual povoado estava em festa. Parecia ser um evento religioso, pois a comunidade se concentrava em torno de uma pequena capela. Homens e mulheres pareciam ter saído de um livro de história, pois era como se voltássemos ao passado, às raízes do império. Eles celebravam com suas vestimentas coloridíssimas.

            O local também abriga uma feira famosa, que tem seu auge todos os domingos, mas estava disponível no dia em que visitamos o sítio. Perto dali os moradores mantêm uma cooperativa, formada somente por mulheres, que trabalham com artesanato feito de lã de alpaca. Aprendemos como funciona o processo de tecelagem e colorização dos tecidos, elaborados com materiais colhidos da própria natureza, exatamente como era feito no passado. Há vários produtos artesanais à venda.

 

            Dali fomos para Moray, um complexo arqueológico de terraços agrícolas, chamados de “muyu” na língua quéchua. Visualmente, eles lembram anfiteatros ao ar livre, mas sua função era muito mais complexa. Os incas testavam, nesses locais, como os diversos tipos de alimentos reagiam aos vários níveis de solo, de temperatura, elevação e incidência do sol. De acordo com os estudiosos, ali eram plantados cerca de 250 cereais e legumes, com destaque para os vários tipos de batatas.

            Perto de Moray, estão as Salinas de Maras, que não tivemos a oportunidade de conhecer. São 3.000 poços de água salgada natural, de onde é extraído o sal peruano de excelente qualidade. Centenas de mineradores ainda trabalham no local. Há alguns postos de venda do produto na região. Trouxemos um pacote para experimentarmos.

 

            A próxima e mais espetacular estação de nosso tour é Ollantaytambo, situado a 97km de Cusco. O povoado é considerado uma “cidade inca viva”, pois os moradores vivem, comercializam, cultivam e realizam seus serviços seguindo as antigas tradições incas.

            De acordo com o historiador cusquenho Valentín Martíne, o nome se origina do general do Antisuyo chamado Ollantay, que residia e tinha seu quartel general nesta localidade. O militar teria se apaixonado pela filha de Pachacútec, nono governante inca, numa história digna de Romeu e Julieta.

            Ollantaytambo também foi um dos povoados que resistiu à ocupação espanhola, mas acabou sendo reconquistada por eles em 1537.

            O sítio arqueológico é formado por uma série de terraços, silos, escadarias, residências, fontes e sistema de abastecimento de água, além de templos dedicados ao Sol. Na fortaleza de Araqama Ayllu estão também o salão real, as termas da princesa e o Intihuatana, utilizado para observar a trajetória do sol. Como em outras construções, os encaixes das pedras são perfeitos e, por vezes, é difícil acreditar como aquelas pedras tão pesadas foram alçadas a lugares tão altos. Os silos construídos no alto da montanha são outra atração à parte, devido à dificuldade de acesso.

            Há uma variada feira de artesanato na entrada do sítio histórico, que é muito visitado pelos turistas. Estivemos lá na parte da manhã, quando ainda era possível transitar no local com uma certa tranquilidade. Na parte da tarde, as filas alcançavam vários quarteirões. Ali também se encontram cafés, restaurantes e outros tipos de comércio.

 

            Encerrando nosso dia, chegamos ao hotel Agusto's, onde pernoitaríamos. Não acreditamos quando vimos – e conhecemos – os jardins da hospedagem. Há muito não via canteiros tão bem tratados, com tanta harmonia e beleza. É claro que esquecemos nosso cansaço e nos dedicamos a fazer um ensaio fotográfico no local, ladeado por construções brancas e montanhas encantadoras. Dali também se pode observar um belo pôr-do-sol. Tivemos a oportunidade de conhecer e conversar com o casal proprietário do hotel, que nos recebeu com extrema cortesia. 

            Depois de experimentar um Pisco, uma forte bebida peruana que me deixou particularmente entorpecido, e saborear uma massa deliciosa, fomos nos recolher, pois no dia seguinte bem cedo iríamos pegar o trem para Machu Picchu, parte final desta viagem.


Chinchero





Detalhes da pintura na fachada da igreja





Povoado se enfeita para evento religioso

Feira de artesanato

Cores desenvolvidas pela cooperativa de mulheres


Regina e Wagner com as artesãs

Moray


Com Regina e Wagner na entrada do sítio arqueológico






Com Wagner, em Moray


Ollantaytambo






Silos no alto da montanha


Feira de artesanato 

Rua da vila

Crianças locais

Sistema de saneamento

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Hotel Agusto´s e seu jardim fantástico














Que tal um pisco?

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