quarta-feira, 28 de março de 2012

Poemas inéditos de Thelmo Lins falam de Paris, Praga e Lisboa

Para inaugurar este blog, apresento alguns poemas que escrevi durante uma viagem à Europa, em 2010. Os textos falam de Paris, Praga e Lisboa, três das cidades visitadas.
Os textos são inéditos e publicados aqui pela primeira vez. As fotos também são minhas. Divirtam-se!


Debaixo da pirâmide do Museu do Louvre



ARCOS TRIUNFAIS

O shopping do Louvre
Com seus turistas afobados
A fotografar cada centímetro
Compete com o shopping da Elisée
De marcas famosas e arcos triunfais.
A japonesa fashion.
O negro étnico, o louro róseo
A modelo espantada,
O casal turco,
A burca e o chapéu.
Paris se multiplica a cada quilômetro quadrado.

Detalhe de obra de Camile Claudel

SEU ROSTO

Sentei-me sozinho no quarto de hotel
Na frente da janela
E me descrevi, detalhe por detalhe, seu rosto.
Só me vinha sorriso e abraço.
Nenhuma cor de pele, nem o risco da sobrancelha,
Nem a cor da íris ou o que restava de seus pelos.
Somente sorriso e abraço.


TORRE EIFFEL

A poesia escrita se cala diante da beleza da paisagem
E durante um mês ficou contida em minhas retinas, minha pele, minha sensibilidade.
Hoje, o vulcão de ferro criado por Eiffel
Meteu-se como uma agulha na minha veia
E exigiu-me retratação,
Resposta, anúncio.
A poesia curvou-se ao encantamento
E elaborou-se timidamente na folha de papel
Como se fosse o efeito daquela droga proibida
A suturar a monotonia.
Corrosão, suplício e glória a romper o caos.

Catedral de Rouen, de Monet (reprodução)

MONET

As pinceladas impressionista de Monet
Transpiram
Gotejam na peleja de luz, no canto do olho.
Reluzem na fachada da catedral,
No jardim, no passeio furtivo, no vento.
Recriam, em mim, a perspectiva da história:
Do que é e do que é visto;
Do que acontece e do que é sentido;
Do que morre e do que fica para sempre.
O jogo de sedução entre o olhar e a sensibilidade.
As pinceladas de Monet me recriam.

Obra de Van Gogh

PINCELADAS FORTES

Eu vi Van Gogh.
Ou será que o pintor debochou do meu olhar
Em seus arabescos de pinceladas fortes?
A visão trai.
Ela é condicionada às lentes dos óculos
E a um olhar de antes, quando apenas achava que via.
Não sei se vi Van Gogh
Ou se ele me vê
Na revisão,
Na reimpressão,
Na iluminação
Do agora para o futuro.

Rio Sena

O PRESENTE

Na morna brisa da tarde
Tendo aos pés a imagem do Sena
Percorro sorrateiramente as ruas de Paris.
A torre, o museu, a língua rubra do céu.
Os sons dos automóveis barulhentos
Afastam-se neste idílio e me permitem comemorar a vida.
Apesar da dor dos calcanhares,
Apesar da embriaguez da terra,
Sobrevoo a mim mesmo,
Socorrendo-me das minhas desesperanças,
Numa forma quase animal de romper as amarras da teia.
Paris se oferece
E eu aceito o presente.

Vista de Praga, com o castelo no alto do morro (foto de Wagner Cosse)

VITRAIS

No castelo de Praga
Observo, atônito, as torres pontiagudas da catedral.
A voz em espanhol me avisa de tantas tumbas,
Tantas mortes, tantos sacrifícios.
Mas a luz dos vitrais sobressai
Pelo encantamento, pela cor.
A luz dos vitrais é a resposta
Às dores daqueles que morreram pela construir a pátria!
No castelo de Praga
Entre ruelas, praças e estátuas douradas,
Guardo ainda a paisagem da cidade abaixo,
Coroada de telhados vermelhos
E pontes salientes.
O rio, a multidão, o relógio encantador, o espocar dos flashes
É a lembrança mais ardente de que a vida superou os cadáveres
E a esperança voltou a brilhar
Na terra da escuridão.

Vista de Lisboa, a partir do Pequeno Príncipe

SERENATA

“Cansei de esperar por ela”,
Começava assim a velha serenata.
E ela não vinha!
Espreitei-a em todos os poros,
Seu sumo, sua carne, seu alívio.
De repente, ao ver a bela alameda de Lisboa
Entre fontes, prédios antigos e árvores milenares
Sua voz voltou a acarinhar meu rosto.
Seu voo percebeu-se a curta distância
E seu canto... rompeu o silêncio e a solidão.
Pois ali estava ela.
Não mais a mesma criança cheia de frescor.
Era outra, ainda bela, mas marcada pela desilusão!
Ao abraça-la, beijei-a como se nunca a tivesse perdido.
E demonstrei (logo eu) carinho que nem havia conhecido em mim.
Na alameda de Lisboa, ela cantou ao ouvido um antigo fado,
A cobrir as harmonias da velha sereneta.
Respirei fundo e chorei.

Em Viena (foto de Wagner Cosse)

ANIVERSÁRIO

No presente aniversário, ouço a voz do seu fado.
Ouço o menino poeta contido em cada faixa sonora do seu corpo
E latejo ora de dor, ora de contentamento.
Anos passados,
Cabelos brancos,
Velas acesas,
Ave marias.
Sinto um comichão no corpo
Que se pressupõe dança.
As formas se descristalizam e volteiam safadas
No impulso presente, presente no impulso.
No presente aniversário,
Não lamento.
Vivo.
Olho.
Levanto voo.
E colho.

Crianças em frente a uma escultura de Rodin, em Paris

DEPRAVAÇÃO

O beijo de Kimt.
O sexo ardente de Schiele
As deformações pictórias de Munch.
A leveza de Mucha.
Pinceladas
Desenhos
Cores
Lágrimas
Histórias
Emoções.
Vida e morte,
Febre, descaso, solenidade.
Teatro, espelho, paisagem,
Loucura
Depravam-se na arte
Para comemorar a humanidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Impressões atuais a respeito de Guarapari

  Em Meaípe, praia da Nova Guarapari (foto de Wagner Cosse editada por Thelmo Lins Clique nas fotos para ampliá-las.                Guarapar...