quarta-feira, 1 de julho de 2015

Bahia 7 - Na capital baiana

No Dique do Tororó, em Salvador



Tenho belas lembranças de Salvador, que conheci em 1995. Antes, havia passado alguns dias em Morro de São Paulo, paradisíaca ilha baiana. Depois, peguei um barco e fui para a capital. Ao ver o perfil da cidade, lembro-me claramente de cantarolar a canção “É D´Oxum”, de Gerônimo, gravada por Gal Costa. O impacto foi se intensificando à medida que chegava ao Pelourinho, onde ficaria hospedado. O hotel era muito simples, mas bem localizado. Naquela época, o Pelourinho estalava de novo. Tinha sido restaurado há pouco tempo e o casario era iluminado por um colorido intenso.
            Vinte anos depois, voltamos ao Pelourinho para nos hospedarmos no charmoso Bahia Café Hotel, na Praça da Sé, próximo ao Terreiro de Jesus. Outros coloridos invadiam a região, com as bandeirinhas da festa de São João. No entanto, apesar do forte policiamento, pairava no ar uma certa tensão. As pessoas nos alertavam insistentemente para cuidarmos das bolsas e das câmeras fotográficas, o que naquela época não parecia tão contundente. Havia muitos mendigos nas ruas e, pior, uma cracolândia bem próxima ao nosso hotel, que particularmente me assustou e me deprimiu. Ver aqueles jovens se drogando e comercializando as drogas era de cortar o coração. Mas, enfim, o que se pode fazer?
            Pelas informações que tivemos, a situação está bem melhor do que há dois ou três anos. Com a Copa do Mundo de 2014, houve uma “limpeza” geral na região. O prefeito atual, ACM Neto, é muito elogiado pelos moradores e taxistas que conversamos. Parece que ele “deu um jeito” na situação, colocando a cidade nos eixos.
            Tivemos apenas três dias para usufruir das terras soteropolitanas. Como havia um indício de chuva, planejamos cuidadosamente para não perdermos as boas atrações. Museus, galerias de artes, visitas ao mercado e aos principais edifícios históricos da região seria uma boa solução, aproveitando inclusive o fato de estarmos na área mais turística da cidade. Havia, também, a intenção de conhecer alguns bons restaurantes, notando que a gastronomia baiana vem se aperfeiçoando bastante. Particularmente, Wagner (meu companheiro de viagem) e eu queríamos voltar ao restaurante do SENAC, localizado no Pelourinho, onde é servida uma excelente comida baiana, com preços bem razoáveis.
            Não sou um expert em gastronomia. No caso da culinária baiana, sou uma negação total. Com problemas para ingerir frutos do mar, arrepio quando sinto o cheio de um camarão. Se comer, passo mal. Ou seja, não posso cometer nenhuma extravagância. Qualquer comida mais condimentada me obriga a tomar um antiácido. Mas consegui apreciar, assim mesmo, várias iguarias. Principalmente aqueles doces maravilhosos, como quindim, cocada baiana e manjar branco.
            No quesito patrimônio histórico, nada impressiona mais na Bahia do que a Igreja de São Francisco, também no Pelourinho. A quantidade de ouro e a pujança só são comparados com algumas igrejas mineiras. O rococó é intenso. Gastam-se horas para observar cada bordado feito naqueles altares. Coisa engraçada, pois o templo é dedicado a São Francisco, geralmente associado à austeridade e  à pobreza. Bem, aqui como em outras partes do mundo (especialmente na mesma Igreja de São Francisco, na cidade do Porto, em Portugal), essa máxima não foi observada. Tudo é de uma sofisticação de cair o queixo!
            Visitamos ainda o belo museu Carlos Costa Pinto, no bairro Vitória. Os antigos proprietários, colecionadores de obras de arte, doaram seu acervo à municipalidade e ainda disponibilizaram a antiga mansão da família para abrigar o acervo. Há um belíssimo mobiliário, recolhido de antigas famílias baianas que sofreram com a falência do período áureo do cacau e da cana-de-açúcar, peças religiosas, prataria e telas. As melhores partes do museu são a coleção de balangandãs e de joias usadas pelas escravas no século 19. Outra atração foi um dos seguranças do museu, que se revelou um grande conhecedor da música popular brasileira. Ele foi um guia fantástico para nós, pois transmitiu grande satisfação em cumprir sua missão. Em Salvador também visitamos um museu dedicado aos cartões postais, com fotos antigas da capital e de várias cidades do interior da Bahia.
            Outra passagem obrigatória, para todo bom visitante, é o Mercado Modelo, localizado na parte baixa de Salvador. Para acessá-la, utilizamos o icônico Elevador Lacerda, que está muito bem conservado. Seu uso foi gratuito nesse dia. No mercado, bem mais interessante do que da primeira visita que lá fiz duas décadas atrás, é um local interessante. Encontra-se de tudo um pouco em relação ao artesanato baiano. Há também dois restaurantes, com bela vista.
            Um dos pontos altos da nossa estadia foi conhecer um terreiro tradicional de candomblé. Da vez passada, estivemos Salvador no período da quaresma, quando não acontecem as cerimônias. Com o apoio de um guia, rumamos ao Alaketu, o mais antigo terreiro do país, fundado em 1636. É proibido fotografar ou filmar a cerimônia. Relato, apenas, que havia muitas danças, cânticos e batucadas. Há várias incorporações e manifestações, inclusive dos espectadores. O ambiente era muito familiar, com pessoas de todas as faixas etárias, entre elas, crianças bem pequenas. Em determinado momento, algumas pessoas saem da sala e decreta-se um intervalo. Logo após o curto período, a cerimônia é reiniciada, já com as mesmas pessoas trajadas como orixás, com paramentos belíssimos. Durante o período em que estivemos por lá, pensei na quantidade de coisas que existem no mundo e que não conseguimos explicar. São eventos que transcendem nosso conhecimento e provocam nosso lado mais racional. Senti-me tranquilo durante todo o tempo, pois acreditei que tudo aquilo era feito pelo bem da humanidade, pela paz e pela tradição religiosa, procedente da África. Foi impossível também não pensar na crueldade da intolerância religiosa, que – por preconceito – não aceita o diferente, o inusitado, o que não conseguimos compreender. Quase no final da cerimônia, o terreiro ainda nos ofereceu saborosos pratos da culinária baiana. Que outro templo religioso faria isso com tamanha sofisticação?
            Por falar em orixás, no dia seguinte fomos à região da Arena Fonte Nova para conhecer o Dique do Tororó, onde estão as gigantescas esculturas criadas pelo artista plástico Tati Moreno. O local lembra um pouco a região da Pampulha, em Belo Horizonte, e se transforma em uma grande área de lazer nos fins de semana.
            Outra atração foi conhecer o Balé Folclórico da Bahia, que tem sede no Pelourinho. Assistimos a um espetáculo da companhia, com algumas das mais expressivas danças tradicionais baianas. Confesso que esperei um pouco mais da apresentação, mas valeu a pena pela qualidade dos bailarinos, dos figurinos e dos músicos. Acho que, para o turista internacional, que lotava parte do auditório, a apresentação foi mais impactante do que para nós, brasileiros, que estamos acostumados a tanta folia. No quesito conforto, o teatrinho é uma lástima. Mas, mesmo assim, vale o ingresso.
            Antes de retornarmos à nossa cidade natal, Belo Horizonte, ainda tivemos tempo para visitar lojas de discos e comprar alguns CDs de artistas locais (coisa que sempre fazemos em viagens). Desta vez, colocamos na mala algumas obras de grupos ligados ao samba de roda, em gravações deliciosas. Trouxemos nas bagagens alguns livros com fotos de Pierre Verger e obras de Caymmi e Carybé, essenciais para quem quer se entranhar na história deste povo tão festivo.

            Encerro, aqui, os meus relatos da viagem à Bahia, em especial à Chapada Diamantina, Santo Amaro da Purificação e Salvador. Foram dias maravilhosos. Parafraseando os baianos, com muito axé! E que venham outras emocionantes viagens para nós! 

Fotos de Thelmo Lins e Wagner Cosse.






Igreja de São Francisco













Pelourinho











No restaurante do SENAC

Wagner no bufê do restaurante do SENAC

Imagem do Museu dos Cartões Postais

Grupo musical baiano apresenta-se no Pelourinho

Capoeirista

Bailarinos
Hotel Bahia Café
Centro Histórico de Salvador
Elevador Lacerda e Mercado Modelo
Porto
Dique do Tororó
Arena Fonte Nova

Fachada do Museu Carlos Costa Pinto

  






Com Wagner Cosse, brindando as delícias da culinária baiana


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