|
Na rodovia que dá acesso ao Parque Nacional Grande Sertão: Veredas (foto de Wagner Cosse) |
Fotos de Thelmo Lins e Wagner Cosse
Clique nas fotos para ampliá-las
“O senhor tolere, isto é o
sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a
fora a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras altas, demais do Urucuia.
Toleima. Para os de Corinto e do Curvelo, então, o aqui não é dito sertão? Ah,
que tem maior! Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos;
onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador; e onde
criminoso vive seu cristo-jesus, arredado do arrocho de autoridade?"
(Guimarães Rosa)
O
livro “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa, foi publicado em 1956. Ele
narra a história de Riobaldo, Diadorim e outros personagens do sertão mineiro e
sua luta pela sobrevivência em um território muitas vezes árido e inóspito. “Sertão
é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus, mesmo, se vier, que venha
armado.”, relata outro trecho da obra, que se tornou um dos mais importantes
clássicos da nossa literatura.
Nos
caminhos do sertão, em especial do sertão retratado por Rosa, é que está o Parque
Nacional do Grande Sertão Veredas, localizado na divisa entre Minas Gerais,
Bahia e Goiás, no noroeste mineiro, a quase 800 km de Belo Horizonte e a pouco
mais de 350 km de Brasília. Criado em 1989, ele ocupa 231 mil hectares, onde a
paisagem predominante são as veredas, conjunto de buritis e buritiranas, que
concentram veios d´água, como se fossem pequenos oásis na paisagem. Além disso,
podemos observar a vegetação típica do cerrado brasileiro, com árvores
retorcidas e campos. Na região estão vários pontos abordados no livro, caminho
dos boiadeiros e sertanejos, cenários incríveis de um dos mais fortes enredos
da obra roseana.
A
fauna do parque é composta por 62 espécies de peixes, 44 espécies de anfíbios
(inclusive um curioso sapinho cinza, que se camufla nas pedras), 31 espécies de
répteis, 56 espécies de mamíferos e 244 espécies de aves, dentre elas a arara-canindé,
o urubu-rei, o gavião-de-penacho. Dentre os animais, podem ser encontradas
onças, veados, tamanduás, lobos.
Gerido
pelo Instituto Chico Mendes, o parque está sediado em Chapada Gaúcha, município
mineiro, na rua que leva o nome do escritor de Cordisburgo.
Foi nesse
paraíso natural que passei três dias intensos (27, 28 e 29 de julho de 2018), ao lado de meu companheiro de
viagem Wagner Cosse, ciceroneados pelo condutor ambiental Elson Barbosa que,
além de guia, nos oferece emocionadas interpretações de trechos do famoso livro
de Guimarães Rosa. Ouvir os textos dessa obra consagrada contextualizados nas
paisagens onde o autor se inspirou é simplesmente encantador.
Ficamos três
dias na região, hospedados no confortável hotel Ares do Sertão, aberto no
início de 2018. Do hotel para o parque ou para as atrações, fizemos o trajeto
de carro. Para entrar no parque de automóvel, é essencial que ele tenha tração nas
quatro rodas. As estradas têm muita areia, que dificultam o tráfego. Sem esta
opção, preferimos fazer os trechos a pé ou em locais onde foi possível transitar
com um automóvel mais possante, no caso uma Renault Duster 4x2. Vale dizer que
há pessoas que alugam carros com tração em Chapada Gaúcha.
É
importante também levar lanche e água para as caminhadas. Elas às vezes duram o
dia inteiro e o sol é escaldante, mesmo em julho, quando é inverno no Brasil.
As temperaturas atingem 30 graus com facilidade.
No primeiro
dia do passeio, Elson propôs uma caminhada de 13km pelo parque. Fomos a um pequeno
mirante, de onde avistamos uma parte do território, quase todo muito plano. Há
poucas montanhas, sendo a principal o Morro Três Irmãos, ponto mais alto do
trajeto e de onde também se avista o mundaréu de terra, entrecortado por
riachos e veredas.
Tivemos,
também, a oportunidade de conhecer e de nos banharmos em uma vereda, a do Capim
de Cheiro, com suas águas frias e avermelhadas, pelo alto teor de ferro. Apesar
disso, elas são límpidas e potáveis.
Confesso
que não imaginava a beleza de uma vereda, que se assemelha a um pequeno jardim.
Há uma infinidade de cores nas florações ao seu redor, principalmente a folha
de fogo, que tem este nome por causa de sua cor avermelhada e de suas florinhas
cor-de-rosa.
A subida
aos Três Irmãos foi bastante íngreme e cansativa. Não fosse o sol tão quente,
talvez o percurso pudesse ser enfrentado com mais tranquilidade. No entanto, ao
chegar no alto, uma brisa intensa refresca o calor e a paisagem é de tirar o
fôlego. Elson, mais uma vez, nos premiou com um dos textos do livro,
interpretados com emoção e veracidade.
A próxima
parada foi uma visita ao Balneário Rio dos Bois, que proporciona um banho de
água cristalina. Para nossa decepção, a lanchonete do local estava fechada e
não pudemos experimentar o peixinho tão alardeado pelo nosso guia. Felizmente,
tínhamos comida para nos abastecer. Por isso, talvez, o balneário estivesse
pouco frequentado. Além de nós três, apareceu um pequeno grupo de amigos.
Fiquei
apenas na observação, não tive a coragem de entrar nas águas geladas. O sol
estava se ponto e a chegada do frio já podia se sentir (durante a noite a temperatura
costuma cair). Mas Wagner não se fez de rogado: mergulhou intensamente nas
águas cristalinas.
Por falar
em alimentação, achamos este o ponto fraco da viagem. Há poucas opções de
alimentação regional e, em algumas localidades, todo o comércio estava fechado.
Se não tivéssemos levado o lanche e água, passaríamos necessidade.
Não poderia deixar de citar que, além das belezas do sertão, o primeiro dia de visita (27 de julho de 2018) ainda teve um componente especial: o eclipse da lua, evento raro e de grande beleza. Ainda mais naqueles locais tão isentos da interferência da mão humana, das luzes da cidade e de outros apelos visuais da eletricidade. Momento marcante para se lembrar para toda a vida!
Por enquanto,
fico por aqui. Na próxima postagem, relatarei o segundo e o terceiro dia da
viagem. Abaixo, alguns contatos importantes para quem quiser desfrutar desse
local de rara beleza:
Hotel
Ares do Sertão (38) 3634-1186
Parque
Nacional Grande Sertão Veredas (38) 3634-1465
Elson
Barbosa, guia e condutor ambiental (39) 99866-3856.
“A vida é
ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do
desespero”.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir