terça-feira, 8 de março de 2016

Marrocos Parte 2 - Entre vales, oásis e as areias do deserto

            
Eu, Wagner e Hassan "atravessando o Deserto do Sahara..." (foto de Ahmed)

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            Esta é a segunda parte da viagem a Marrocos, iniciada no dia 13 de fevereiro de 2016. Estamos – eu e meu companheiro de viagem, Wagner Cosse – em Oarzazate, cidade da área central do país, pouco mais de 190 km de Marrakech.
            Além de ser o principal polo cinematográfico de Marrocos, Oarzazate é também a porta de entrada para quem quer conhecer o deserto do Sahara. É uma cidade em franco desenvolvimento econômico e turístico, com cerca de 280 mil habitantes. Depois do café da manhã do Dar Rita, pousada de nossa anfitriã, Rita Leitão, partimos com o motorista Ahmed para a região de Merzouga, onde situam-se as dunas de Chebbi, ou Erg Chebbi, na divisa com a Argélia, ponto inicial do Sahara.
            Fizemos a rota entre Orzazate e Merzouga, passando pelo Oásis de Skoura, o Vale do Drá, o Vale das Rosas e pelas Gargantas do Todra. A entrada, conhecida como a Rota dos Mil Casbás, enfrentada duramente, pois neste dia fomos acometidos por um vendaval, que provocou uma tempestade de areia e poeira. Ela foi fruto, segundo Ahmed, dos ventos gelados que vinham das montanhas do Alto Atlas, anunciando que a temperatura iria cair nos próximos dias. O que acabou se confirmando.
            Encerrados no conforto do automóvel, com ar condicionando, vimos a penúria que a população passa quando acontece um efeito climático desta natureza. Quando chegamos ao Oásis de Skoura, patrimônio tombado pela Unesco, tivemos dificuldade de caminhar, tamanha era a ventania – acompanhada de muita areia e pó. Neste local, com um extenso palmeiral, visitamos a casbá Amridil, uma impressionante construção do século 17. Dentro, parece que tudo se acalmava e ficávamos protegidos das intempéries. A casbá  conserva a forma tradicional das construções marroquinas do deserto, com os hábitos e costumes que marcam o povo berbere. Ali pudemos observar os pátios internos, repletos de utensílios que demonstram as formas de subsistência da população, como a obtenção da escassa fonte de água para suas plantações, o seu modo de vida e de como comercializa e defende sua família. O guia Réba nos recepcionou e fez um deslumbrante relato sobre todas as dependências, fazendo-nos entender e conhecer um pouco melhor a história de seu povo. A visita custou em torno de 20dh (cerca de dois euros) por pessoa e durou cerca de uma hora.
            Em seguida, o caminho enveredou pelo pelos vales do Drá e das Rosas. O primeiro tem esse nome por causa do rio que o banha. O segundo, devido ao cultivo das flores, que são transformadas em diversos produtos cosméticos e de limpeza.  Aproveitei para comprar um perfume, destes que a gente borrifa no ambiente, para sempre me lembrar dos odores do Marrocos. Passamos também por uma sequência palmeirais e plantações onde pudemos observar como o povo marroquino aproveita cada migalha de água que consegue. Era impressionante ver como o verde serpenteava entre as montanhas ressecadas pelo calor e pela falta de chuva. Os vales funcionam como pulmões, que alimentam e proporcionam vida àquela população.
            Ventanias à parte, conseguimos chegar às Gargantas do Todra, já sentindo a queda da temperatura. O sol coloria as imensas rochas de vermelho. No interior, um pequeno riozinho gelado atravessava a garganta, dando formato às pedras e alagando o palmeiral, permitindo o desenvolvimento de todas as comunidades, graças à abundância de água na região. Um rico manancial dentro de um ambiente tão inóspito.
            Saímos dali em direção a Merzouga, com uma sequência de vistas  deslumbrantes da estrada, entre vales e montanhas. De repente, um grande portal demarca a entrada na cidade. Rumamos diretamente para o ponto de apoio, de onde iríamos pegar os dromedários para percorrer aproximadamente uma hora e meia até o local onde passaríamos a noite.
            É bom frisar que não se fala “camelo” no Marrocos e, sim, “dromedário”. As diferenças são que camelo tem duas corcovas, ao invés de uma. E dromedário é um animal típico da África, ao contrário de camelo, que é oriundo da Ásia, em especial da região do Oriente Médio. Pelo menos foi assim que nos explicaram e lemos.
            A trilha, adentrando as areias do Sahara, seria feita somente por Wagner, por mim e pelo responsável pelos dromedários, Hassan. Adianto que não consegui me sentir confortável no dromedário. Embora seu passo seja tranquilo, a partir de um tempo – mesmo com o acolchoamento – a corcova começa a incomodar. Além disso, o sacolejo me impediu de fotografar. Depois de um tempo, pedi para descer e enfrentei o resto da trilha a pé.
            O por do sol esperado, atração principal do passeio, não veio, pois os ventos cobriram o céu de nuvens. Então, não obtivemos aqueles belos efeitos que o crepúsculo provoca nas dunas. Mas, depois de enfrentarmos a trilha/caminhada e o frio intenso que se já incomodava, chegamos às tendas onde passaríamos a noite. Era um acampamento considerado luxuoso, no meio do deserto exclusivo para mim, para o Wagner, que estávamos ali sozinhos (sem contar com os profissionais). Os outros três hóspedes que haviam reservado cancelaram a noitada.
            Fomos recebidos com o tradicional chá e, um pouco mais tarde, por um jantar digno dos paxás. A ideia é que nos fazer sentir como saídos das páginas das Mil e Uma Noites. Tapetes, tecidos coloridos, lamparinas e muito charme formavam a decoração do ambiente. Para dar um charme especial, Hassan e o gerente do hotel, Hami (que também era o talentoso cozinheiro), apresentaram um pequeno show musical com canções do deserto. Ao falarmos que éramos cantores brasileiros, participamos da segunda parte da apresentação, cantando canções do nosso país, acompanhados por tambores berberes. Foi emocionante e inusitado!
            O dia amanheceu por volta das 6h30 da manhã. Neste horário, já estávamos no alto de uma duna, acompanhando o nascer do sol, com todos os relevos que o jogo de luz e sombra provoca nas dunas. Acarinhados por um belo dia que se descortinava, já sem os ventos do dia anterior, descemos para tomar o café da manhã na tenda principal do acampamento. Em seguida, mais quarenta minutos de dromedário até o ponto em que o nosso motorista estava nos esperando para darmos prosseguimento a nossa jornada pelo Marrocos. Por incrível que pareça, consegui enfrentar essa parte sem tanto sofrimento, em cima do animal. E acreditando que estava vivendo uma experiência única em minhas vida.
            Bessalama (Tchau)!


Durante a noite, no acampamento, choveu intensamente. Acordei com o barulho das águas na lona das tendas. Não pude evitar certa tristeza ao saber que os dromedários estavam lá fora, presos nos pés e obrigados a ficar ajoelhados durante toda a noite, tomando aquele temporal. São algumas coisas assim, da viagem, que fazem nosso coração cortar, mas que integram a tradição do país.
Outro ponto negativo foi a falta de água quente no acampamento/hotel. Ou seja, simplesmente passamos a noite sem banho, pois o frio era de rachar. No dia seguinte, soubemos que os outros três hóspedes haviam cancelado a pernoite por causa disso.
           
Entrada principal de um dos estúdios de cinema em Oarzazate


Com o guia Réba, na entrada da casbá de Amridil

O interior de Amridil

Amridil

Amridil e o Oásis de Skoura

Vale fértil do Drá

Vale do Drá

Gargantas de Todra


Todra e a lua

Gargantas de Todra

Vale das Rosas

Montanhas do Vale das Rosas

Vale das Rosas

Tinejdad

Antiga prisão marroquina



Oásis

Portal de entrada de Merzouga

Cuidado: dromedários na pista!

Em Erg Chebbi, no Deserto do Sahara

Acampamento

Interior da sala de jantar do acampamento

Wagner no dormitório do acampamento: clima das Mil e Uma Noites

Jantar no acampamento

Hassan e Hami no show particular

Amanhecer no deserto





No Deserto do Sahara (foto de Wagner Cosse)

Foto de Wagner Cosse

Foto de Wagner Cosse


sábado, 5 de março de 2016

Marrocos Parte 1 - No Vale de Ounilla e Ait Benhaddou

Thelmo Lins, tendo ao fundo a casbá de Ait Benhaddou (foto de Wagner Cosse)
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            No dia 13 de fevereiro de 2016, começamos (eu e meu companheiro de viagem, Wagner Cosse) o tour por Marrocos. Até o dia 27 deste mês percorremos várias cidades, entre elas Marrakesh, Fez, Rabat, Casablanca e o deserto do Sahara, entre outras localidades, cumprindo mais de 2.000km. No texto que escrevo, aparecem nomes de localidades que, às vezes, soam complicados para a língua portuguesa e ainda alguns substantivos como dar, riad, casbá, medina e outros, que mereceram um pequeno dicionário no final deste texto, somente para que possa entrar no espírito.
            Fiz, ainda, um mapa com os locais que percorremos, com a ordem cronológica da viagem, somente para facilitar o entendimento e o acompanhamento. Não pretendo, neste texto, esgotar o assunto, mas apenas apresentar as sensações (e as imagens) deste país deslumbrante, ilustrado por fotos que tiramos.
            Confesso que, quando recebi o convite para viajar a Marrocos, sugerido por Wagner, achei que iria repetir muito as mesmas impressões da Turquia. Ledo engano. O país apresentou uma gama variada de climas, sabores, cheiros, experiências que fogem a tudo que já havia conhecido anteriormente.
            Para começo de conversa, a viagem foi realizada por intermédio de uma agência portuguesa que atua em Marrocos, descoberta por meio do site da agência www.marrocos.com. Os proprietários são os irmãos portugueses João e Rita Leitão. Eles vivem em Oarzazate, uma das primeiras cidades visitadas, e portal de entrada do deserto do Sahara. A comunicação foi bastante facilitada pelo fato de eles falarem nossa própria língua. A agência oferece vários pacotes prontos, mas nós propusemos algumas modificações, a partir da pesquia na internet e a leitura de guias sobre o país, em especial o Lonely Planet, o único que encontrei com tradução para o português (vejam o roteiro no mapa).
            De Lisboa, onde estávamos, pegamos um voo para Casablanca e, em seguida, fomos para Marrakech. Para quem mora em Belo Horizonte, como nós, viajar para Lisboa e, depois, para o Marrocos, é uma possibilidade, pois não temos que enfrentar a ponte aérea para São Paulo e esperar algum tempo nos aeroportos, pois existe um voo direto entre São Paulo e Casablanca. Mas acabamos tomando chá de aeroporto em Casablanca (mais de cinco horas), pois não encontramos voo direto entre Lisboa e Marrakesh. Enfim, chegamos exaustos a Marrakech já bem tarde da noite e eu só consegui fazer um pequeno lanche, tomar um banho e cair na cama.
            De manhã bem cedo, o motorista que iria nos acompanhar toda a viagem já estava nos esperando após o café da manhã. Seu nome é Ahmed e ele fala espanhol. O tour seria feito em um automóvel 4x4, bastante confortável, somente nós três: Ahmed, Wagner e eu.
            Na primeira etapa, atravessamos as montanhas do Alto Atlas em direção a Oarzazate, totalizando 196km. Subíamos estrada íngremes, mas com boa qualidade de pavimentação. As vistas da cordilheira eram arrebatadoras. Ela divide Marrocos em duas partes: a parte oeste, voltada para o Oceano Atlântico, com terras mais férteis, por causa da maior incidência de chuva; e a parte leste, voltada para o Sahara, mais árida, pontuada por alguns vales e oásis.
No caminho, visitamos Telouet e o Vale de Ounila. Em Telouet, Ahmed nos apresentou a um lugar impressionante: a casbá do outrora poderoso paxá Glaoui. Ele caiu em desgraça por ter apoiado a França, país que colonizou o Marrocos até 1956, contra a independência. Fruto disso são a ruína de suas antigas propriedades, que foram deixadas ao seu próprio destino pelo governo marroquino, de família opositora. Embora muito destruídas, elas mantém algumas dependências luxuosas, como as salas de recepção do segundo andar, que, atualmente, são guardadas por pessoas humildes da região, que cobram um valor simbólico de 20 dirhans para visitação. A seu modo, eles lutam bravamente pela preservação desse belíssimo monumento.
Um pouco mais adiante, outro esplendor: a casbá de Ait Benhaddou. Encravada em uma montanha, com uma paisagem de tirar o fôlego, a pequena vila é considerada patrimônio da humanidade pela Unesco. Ao contrário de Glaoui, está muito bem preservada, considerando sua longevidade: ela foi fundada em 757 D.C. Logo ficamos sabendo que o local foi cenários de vários filmes, entre eles “Lawrence da Arábia”, “Jesus de Nazaré” e “O Gladiador”, dentre tantas outras películas. Enveredamos por suas ruazinhas, repletas de pequenas lojas e alguns cafés para chegarmos até o topo, onde tínhamos uma vista de 360º da região.
O vale de Ounilla, que adentramos em seguida, configurou-se na primeira forte impressão, que confirmaríamos nos dias seguintes, da tenacidade do povo marroquino. Em rios praticamente secos, com pouquíssima água (neste inverno choveu bem menos do que era esperado), eles conseguem fazer aflorar plantações de algumas de suas principais culturas, com a árvore de argan, a amendoeira e a tamareira, dentre inúmeros cultivos. Era possível vislumbar, no meio das casas coloridas pelos tons da terra, a maioria cor de ocre, os pontos verdejantes.
Por fim, chegamos a Oarzazate no final do dia, onde iríamos nos hospedar na Dar Rita, hotel dos irmãos Leitão, coordenadores de nosso tour pelo Marrocos. Fomos recebidos pelo tradicional chá marroquino (verde, com hortelã), acompanhado por biscoitos. É a senha de boas vindas desse país encantador.
Agora, um pouco de descanso para enfrentarmos, na próxima etapa, o caminho para o deserto.
Akranwes daghr (até mais)!

Pequeno dicionário marroquino:
Ait – Família
Casbá – Espécie de forte ou cidadela; posteriormente, centro administrativo de uma cidade.
Dar – Casa
Dirham – Moeda local. Em fevereiro de 2016, um euro equivalia a 10,60 dh (e, com um euro, podia-se comprar aproximadamente 4,50 reais)
Erg - Dunas
Riad – Casa urbana, com jardim interno. Virou sinônimo de hotel ou pousada em Marrocos. Mas, para ser um verdadeiro riad, é necessário haver um jardim interno.
Medina – Centro velho, onde fica a parte histórica das cidades.
Souq – Mercado

Observações:
Ao contratar um tour, saiba se ele inclui ou não um guia. No nosso caso, acreditamos no início que Ahmed, nosso motorista, também era um guia. Como suas respostas eram evasivas e pouco informativas, começamos a ficar incomodados. Ficamos sabendo, posteriormente, que ele é somente um motorista. Tivemos o auxílio de alguns guias, mais tarde, em alguns pontos específicos, nas medidas de Fez, Marrakech e Rabat e em alguns museus e centros culturais.
Não tivemos problemas com a comida. Os restaurantes que frequentamos ofereciam comida marroquina e internacional. Sempre optamos pela marroquina, cujos principais pratos são o tajine (ensopados feitos em tradicionais panelas de barro, que pode ser de carne ou vegetariano), o cuscuz e espetinhos. Em alguns casos, acompanhados de batata frita, arroz e pães. Os menus tinham, como entrada, salada ou sopa. A sobremesa era sempre uma fruta, em especial a laranja cortada em tiras, com canela. Atesto que, mesmo para uma pessoa com algumas restrições alimentares, como eu, que detesta cebola e não pode com frutos do mar, a comida do país é muito saborosa. Não tivemos problemas com comida apimentada.
No campo gastronômico, é importante saber que as porções marroquinas são muito fartas. Mais tarde, mais cientes da situação, Wagner e eu começamos a pedir somente um prato (ao invés do menu completo). Às vezes nos satisfazíamos apenas com a entrada. Os preços iam de 20 dh, para uma sopa, acompanhada de pães, até 130 dh pelo menu completo. Como bebida, a pedida era o delicioso suco de laranja (de 4 a 20 dh, em média).
Os marroquinos, maioria islâmicos, não bebem álcool, pelo menos publicamente. Não existe o hábito de se sentar num bar ou café para tomar cerveja ou outra bebida. O “uísque” deles é o chá, muito popular e apreciado por toda população. Se quiser experimentar uma bebida, em especial um vinho marroquinho (que tem boas safras), pode pedir no hotel ou em restaurantes específicos, que atendem turistas, estrangeiros e pessoas que não professam a religião islâmica.
Outro ponto, também, é a proibição de visitação a mesquitas por pessoas não islâmicas. Existe apenas duas exceções no país, sendo uma delas a grande mesquita Hassan II, em Casablanca, que cobra 120 dh por uma visita guiada de uma hora.
Por fim, vale a pena atentar para a roupa. Não são bem vistos decotes acentuados ou shorts muito curtos (especialmente para mulheres). Nada como uma boa calça jeans ou um agasalho esportivo, com tênis confortáveis. A temperatura, nesta época do ano, é baixa, mas pode esquentar durante o dia, chegando a 25º.

Fotos de Thelmo Lins e Wagner Cosse

Mapa do tour em Marrocos. Marrekech foi o ponto de chegada e partida.


Cordilheira do Alto Atlas

Vale com plantações

Plantações de argan

Fruto de argan

Amendoeira

Telouat e a Casbá Glaoui







Thelmo em uma das janelas de Glaoui

Vista da região

Wagner no salão principal da casbá

Vale de Ounilla



Casbá que se transformou em hotel, na região

Ait Benhaddou 




Wagner acena do alto da casbá


Gastronomia


Cuscuz

Espetinhos

Tajine

Chá com biscoitos

Laranja com canela e ameixas

            

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